quinta-feira, fevereiro 15, 2007

126 - A árvore suporte do mundo no espaço urbano (I) – dos homens-árvore às florestas de resinosas e folhosas, artigo de Celeste Ramos - Infohabitar 126

 - Infohabitar 126

Celeste Ramos
Participação de António Baptista Coelho na ilustração (parte das figuras)


Palavras-chave: ecossistemas globais [alianças florestais mundiais - floresta (mata) - continuum naturale-contínuo edificado]; REN urbana, estrutura verde urbana e corredor verde [pulmões urbanos]; árvore notável, árvore património e árvore viária [na estrada, no passeio de peão e alameda e no jardim público e privado]; água na cidade e fauna urbana; ecossistema urbano versus ecossistema humano [a alma das gentes e da árvore - espaços para a alma, o silêncio, a meditação e o divino - a música do vento e a árvore inspiração do poeta - a árvore que na copa capta o sol e na raiz capta a água]; o espírito da árvore e o espírito do homem

Resumo
Partindo de citação breve dos grandes agrupamentos fitossociológicos planetários a fim de ter uma ideia global das condições geo-edafo-climáticas que os determinam, passando pela caracterização de resinosas e folhosas, centra-se a forma como são "escolhidas" para o espaço urbano e referem-se as mais variadas funções na qualificação do espaço urbano e termina-se com apelo de geo-consciência e geo-cidadania.






A árvore suporte do mundo no espaço urbano

Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores
É preciso também não ter filosofia nenhuma
Com filosofia não há arvores - há ideias apenas
Há só cada um de nós, como uma cave
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela

Filosofia de janela fechada
Alberto Caeiro, 1925





A cidade é por excelência o espaço dos homens e há Homens que são como árvores


Da semente virtual de que nasceram, lançaram como vida uma radícula e caulículo, um folículo, flor e fruto, muitas flores que deram fruto e sementes, muitas sementes.
Conheci uma "árvore" dessas, grande, o fundador na universidade técnica de Lisboa, do curso de arquitectura-paisagista em 1942, que votou toda a vida ao seu sonho.

A árvore, a paisagem, a vida, a beleza, a ordem das coisas revalorizando-as num todo holístico, para conforto final do homem integrado no seu meio como se lhe tivesse sempre pertencido em réplica do Éden.

Como homem inteligente e sensível e multicultural, da árvore nasceu um grande tronco, a primeira geração dos seus alunos alguns dos quais ainda vivos, Gonçalo Ribeiro Telles, seu primeiro assistente, António Viana Barreto, Ilídio de Araújo, Álvaro Ponce Dentinho, os primeiros professores, conhecidos no mundo da profissão, tendo eu própria que iniciei a "profissão-no-feminino", testemunhado, em congressos internacionais, como essa semente não só era conhecida, como dava imediatamente "selo de qualidade" a quem quer que tivesse sido seu aluno, facto que reporto como invulgar naquele tempo, não sendo, no entanto, hoje invulgar dizer-se que "estudei canto ou piano com", "fiz doutoramento orientado por" ou, fiz "os meus estudos na universidade de", atestando, assim, a qualidade do conhecimento adquirido.

Esse mundo dos saberes da Terra e dos Homens, não se resumindo porém a esses profissionais, tornou-se prisioneiro-aprisionado dos que tendo apenas aprendido alguns termos lexicais, se julgam possuidores por direito e convicção, fazendo os usos mais nefastos para a Terra e para os Homens, podendo-se observar, nas paisagens urbanas e rurais e sócio-culturais, a apreensão que desses valores fizeram, desmantelando-as; mas não tenhamos medo demais, porque a religião pode ser mal usada por quem a professa, mas continua imutável na sua essência, como todas as verdades da verdade das coisas.

Estes profissionais cujos nomes se citaram, troncos da mesma raiz, apenas em meio século conquistaram o privilégio de ver hoje o trabalho de suas vidas constituir património intelectual nacional, ao ter sido "arquivado" na biblioteca nacional da direcção-geral de edifícios e monumentos no Forte de Sacavém (Jan.2006), património de uma vida de seriedade e de pesquisa pioneira, tornado património público pelo menos nacional.

Como eles, a árvore cujo fuste for cortado transversalmente mostra "anéis de crescimento" vendo-se uns mais claros e frágeis, anéis de crescimento em primavera chuvosa já a aquecer, outros mais escuros e densos, os anéis de crescimento de Inverno de tempo seco e frio, mas não parando de crescer mesmo que cada um, como cada árvore, tenha tempo de vida geneticamente determinado, mas dando sempre semente, porque ninguém extingue a vida por mais desgraçada que a torne.





Dessa árvore nasceram as grandes ramadas

Dessa árvore e do seu tronco que denomino eu própria de primeira geração, nasceram as grandes ramadas, já em pleno feminino, talvez porque essa profissão trata da vida e do fazer nascer e crescer e não pareceria certo que, mais uma vez, fosse gueto exclusivo do mundo masculino, neste tempo em que guetos se desfazem e novos nascem, enquanto os homens não interiorizarem que só há homens num único gueto que é o ser humano e o próprio Planeta e, até lá, uns vão à frente dos outros na destruição de guetos e na re-construção das coisas mais consentâneas com a verdade da Terra e dos Homens.

A preparação intelectual recebida tratava da vida no seu todo em áreas tanto científicas como do mundo das artes e da intuição sensível, saber sem guetos nem descontinuidades, puzzle em pirâmide do conhecimento do Planeta e não apenas de uma "das partes" (já que cada parte contém o todo como o macro contém o micro), perpassando da geologia à geografia e história ou história de Arte dos Jardins, botânica e filosofia e desenho e construção dos espaços concebidos, obra "acabada desde o estudo do espírito do lugar", ao planeamento e projecto até o ver de pé.

Abençoados os homens-árvore que, como esta árvore-pioneira, dão vida à vida e a fazem perpetuar num fluir contínuo passado de geração em geração e lhe vão acrescentando a sua criatividade individualizada sem perder a essência da semente.

A 11 de Março é celebrado o Dia Mundial da Árvore, data na qual a actividade mais importante se confina apenas ao ambiente escolar básico com passeios pela natureza e a plantação de uma árvore nem sequer em espaço escolar, como se as ciências da natureza se resumissem a "coisa de crianças", sem mais significado nem continuidade vida fora, qual semente que não vai dar fruto em idade de adulto e de decisão; esquecendo-se que o ensinamento destas ciências, base da ecologia e do ordenamento das paisagens urbanas e rurais e do ordenamento da vida, permite ficar "marcado" como se fica ao aprender a língua-mãe, nos gestos do quotidiano e para manutenção e fiscalização, natural, da qualidade de vida e do ambiente privado e do todo colectivo.





A terra-mãe agoniza


Por isso a terra-mãe, como a nossa que habitamos, agoniza, e a cidade das pedras e da água, dos jardins e da árvore, continua a revelar o maior desequilíbrio porque se perdeu a mais importante dimensão e função da terra e da árvore e daquilo que dela deriva como sustentáculo do próprio solo e clima (situações edafo-climáticas), de sustentação dos declives, da fauna terrestre e dos pássaros e da flora, da qualidade do ar e da água (e quantidade), dos perfumes, da cor e até da luz e das formas, enfim, da "saúde da terra", fora e dentro da cidade, e por fim das quatro estações do ano que o homem não pode alterar só por se tratar de uma dimensão do céu, mas que até contra elas se rebela dentro do espaço urbano, porque calor sempre lhe agrada, mas, sobretudo chuva, o faz decepcionar e denominar "mau tempo", como se sempre tivesse havido bom e mau tempo, excepto, de facto, agora, em que o homem interveio de forma inconsciente e desastrosa mas continuando, mesmo assim, a acusar "o tempo", sempre o tempo, como se fosse inocentemente autista e recusasse aceitar a parte que lhe cabe e "emendar a mão".

Interessante ver como o homem urbano, mesmo o mais erudito, esqueceu o que aprendeu na idade escolar truncando, a partir daí, a sua existência como um elemento da cadeia global da vida, embora seja o elemento do topo da cadeia alimentar planetária, tornando-se exactamente por isso o grande predador.





A árvore da cidade e as “cidades” das árvores – as florestas

Mas a ÁRVORE da Cidade não nasceu na cidade porque a cidade, mesmo Ur com os seus 6 mil anos, é posterior, como tudo o que o homem fez, porque a árvore é o ser mais velho da terra, sustentáculo do mundo e da vida.

A Árvore faz parte de conjuntos maiores denominados Associações e Alianças (sistemas fitossociológicos), mais comummente designados por ecossistemas, como se a árvore fosse deles a semente que lhes vai dar origem e abrigo a outras espécies vegetais e também os animais, num todo diferenciado de interdependência em interdependências maiores e globais, por regiões planetárias, distinguindo-se assim a floresta do frio e neve ou Boreal, da floresta equatorial e inter-tropical sua derivada e, por fim, a floresta da zona temperada, sobretudo do hemisfério norte de planícies húmidas e savanas, de áreas montanhosas e grandes vales, área e riqueza consumidas ao longo de milénios para se implantar a Ecúmena (20-40ºN), onde é maior a variabilidade de solos e de climas, de fauna e de flora, o Paraíso do homem, o Hemisfério Norte com as Zonas Temperada Quente e Temperada Fria.

Para quem se interessar pela árvore em Portugal e os ecossistemas naturais que determinam, adquira o livrinho simples e bem sistematizado – A Árvore – de autoria de Francisco Caldeira Cabral e Gonçalo Ribeiro Telles e perceberá o que se escreve, apesar de quase ninguém de nenhuma condição sócio-cultural saber nenhum nome das árvores (e arbustos) com que co-habita toda a vida e que até terá ao sair da porta de sua casa, e perguntar-se-á porquê.

No entanto, o espaço nacional possui verdadeiras raridades mundiais, como é o caso do complexo vegetal da Serra da Arrábida, recentemente classificado como Parque Natural e fazendo parte da Rede Natura e da Biosfera, para preservação dos vestígios da floresta mediterrânica, no entanto o local escolhido, pelos decisores, para extracção, com dinamite, de pedra para construção da Expo-98, e do complexo urbano que se lhe seguiu, implantado no leito de máxima cheia do Tejo, privatizando espaço público e entaipando o rio que já não pode ser usufruído como paisagem quando se toma o comboio Lisboa-Porto, ignorando-se completamente os princípios de ética da natureza e direitos colectivos ao património natural global de direito público.

Em contrapartida, ainda se conseguiu salvar, outra raridade igualmente única no mundo, a formação florestal denominada Laurisilva (de Laurus-loureiro + silva-floresta) existente na Ilha da Madeira nas grandes altitudes, floresta higrófila da região sub-tropical húmida com quase 15 mil hectares, ricos em espécies todas perenes como o Till e Vinhático (sempre usados para o magnífico mobiliário de igrejas e conventos e para os mais delicados desenhos de talha), para além do Barbusano, Cedro da Madeira e loureiro que bem conhecemos no nosso quotidiano, floresta com a particularidade de ser de folha perene nas árvores e arbustos, fetos e musgos, líquenes e plantas endémicas, numa massa densa em todos os seus "andares" (perfil da floresta). Esta reserva gigantesca do Conselho da Europa apenas desde 1992, património UNESCO desde Dezembro de 1999, é reserva de valor não apenas botânico, mas de turismo de lazer e científico, algumas das "jóias da coroa do património natural" que só muito tardiamente se protegeu por imposição de Directivas da UE sobre Aves e Habitats Selvagens .





Resinosas e Folhosas


Assim sendo, vejamos a forma mais fácil e pragmática de distinguir dois grandes grupos de árvores – as Resinosas e as Folhosas.

Quanto às primeiras, originárias de latitudes frias e mesmo geladas, as folhas são, principalmente agulhas agrupadas de 2 em duas a 5 em 5, ou escamas imbricadas organizadas em raminhos planos ou "despenteados", com as copas em geral de forma piramidal, por mais variadas que sejam as ordens em que se agrupam várias famílias (taxonomia e nomenclatura) e, portanto, os órgãos de que é formado todo o mundo vegetal e a Árvore (dendrologia).

Das áreas geladas das brancas montanhas de neve do Canadá, faz parte essa escultura do Vidoeiro (Bétula celtiberica), espécie que na última glaciação veio até ao vale do Zêzere e lá ficou, entre as moreias na Serra da Estrela.

Em contrapartida, outras folhosas, de folhas diminutas e perenes, mas de áreas quentes e secas, serão os carvalhos do sul (sobreiro-Quercus suber e azinheira-Quercus ilex spp. rotundifolia), abundantes no habitat próprio de Trás-os-Montes e Alentejo (e na serra algarvia), no norte acompanhadas pelo castanheiro (Castanea sativa), enquanto no sul litoral são acompanhados do pinheiro manso "pin parasol" (Pinus pinea), produtora de magníficos pinhões, espécies votadas ao maior desprezo quando se trata de abrir estradas, ou de implantar urbanizações privadas e turísticas, ou mesmo de as fazer submergir com a faraónica e duvidosa barragem do Alqueva com 60 km de regolfo, que foi sepultura de 4 milhões de árvores da flora natural selvagem (mas altamente produtiva), que não passa do maior lago artificial europeu e que é apenas efluente de todo o tipo de poluição do país vizinho onde está a nascente do Guadiana e alguns afluentes, mesmo que lhe tenha sido retida, a montante da fronteira, alta percentagem do seu alto caudal, logo descarregado em tempo de cheias, no país vizinho, como acontece com o Tejo e o Douro e sendo que, mesmo muito bem "arborizadas as margens de qualquer rio", com os rios internacionais e a capacidade de construção de barragens gigantescas, a tendência dos países onde tem origem a nascente, têm tendência para reter a água em tempo seco e de a expulsar em tempo de grandes chuvadas.

Antes das barragens, os países detentores dos estuários possuíam por geo-direito, essa riqueza e, recentemente, são verdadeiras "ETAR" porque a lei internacional não funciona.

Mas voltando ao sobreiro, essa grande árvore centenária, continua a ser objecto de "orgulho" nacional ao dizer-se que dele se produzem as melhores rolhas do mundo de cuja produção é exportada 70% para o champanhe francês, e embora sendo desde há muito a árvore mais protegida, é diário o noticiário sobre o abate ilegal e legalizado de centenas de sobreiros, mesmo existindo na administração pública ministro do ambiente desde 1975.





Sobre a fundamental investigação agronómica

E destaca-se o actual total desinteresse pela investigação agronómica, que já teve tempos áureos no país a partir da primeira metade do século passado, tanto em solos (primeiras cartas de solos mundiais em paralelo com a classificação americana), de que foi pioneiro no mundo Botelho da Costa, um velho professor meu, como em outras matérias: na Estação de Citricultura de Setúbal (actualmente grande urbanização sem qualquer memória das famosas laranjas de Setúbal) com o director Eng.º Henrique Roovers da Costa Neves; na Estação de Pomicultura (e sobreiro) de Alcobaça com o investigador Eng.º Vieira da Natividade (sem qualquer memória da produção e variabilidade de fruteiras); e ainda na Estação Agronómica Nacional em Oeiras fundada pelo agrónomo Sousa da Câmara. Todas elas com os dias contados desde há apenas 20 anos.

O grande mosaico paisagístico do país desapareceu, correspondente às suas 33 regiões-naturais (classificação de Ribeiro Telles), apesar da diminuta superfície do país, adentro das 11 províncias administrativas, desaparecendo os muitos saberes de muitos homens ilustres a par dos saberes dos habitantes rurais, desaparecendo a grande riqueza da terra (e do mar). Morreram sem direito a Requiem. Deram lugar ao economicismo patético e demolidor dos bens naturais nacionais, riqueza primordial impedida de se desenvolver e de dar continuidade à identidade nacional primordial e a todos nós descendentes desses habitantes nativos que já existiam quando da invasão Romana, resistindo ainda mais de 1000 Castros na região Porto-Braga, mosaico paisagista humanizado não apenas no tratamento da terra mas também na construção desses "cidades" de pedra de planta circular e telhado de colmo e das Ermidas também de granito.





Ainda sobre folhosas e resinosas

Como árvore igualmente folhosa e perene lembremos a Alfarrobeira sobretudo algarvia, que pode ser milenar, de que, igualmente, não se soube retirar proveito excepto na aguardente feita a partir dos seus frutos, que, na Europa, são importados para alimentação, sobretudo na doçaria. Nada português é matéria-prima, ponto de partida de indústrias agro-alimentares, excepto para "lenha para lareira" ou, de preferência, para betuminoso e betão.

O sistema vascular das resinosas, primário, a composição orgânico-mineral e a pequenez desses elementos aéreos de superfície mínima e rija (agulhas e/ou escamas), faz com que necessitem de pouca, muito pouca água e aguentem calor sem transpirar, o que não significa que não sejam frágeis, e tal que não vegetam, em geral, nem em solo demasiado húmido embora precisem de chuva mas com solos de boa drenagem interna para não reterem água originando apodrecimento do sistema radicular (têm como habitat essencial as montanhas e vertentes que as protegem das derrocadas e são o principal responsável pela infiltração das chuvadas).

As resinosas não vegetam em boas condições em espaço urbano, excepto bem acompanhadas em conjuntos em Jardins, ou em áreas urbanas de clima frio e ar puro, como é o caso por exemplo de Trancoso, que acaba, neste mês de Novembro 2006, de ser escolhida para o primeiro projecto europeu, pioneiro, de "cidade-ecológica" – ora que boa notícia.

Quase exclusivamente são árvores de folha perene ou sempre-verde, excepto duas ou três excepções como é por exemplo o caso do Taxodium disticum e da Akea sp. Mas como qualquer indivíduo do mundo vegetal, sem no entanto perder a sua bela copa, deixam ao longo do ano cair na terra folhas, raminhos, frutos e sementes que se vão biodegradando com o auxílio dos microorganismos do solo (terra-viva), sendo que a folhada (elementos separados da planta mãe mas ainda reconhecíveis) se vai decompondo e formando húmus ácido (moor).

A este grande grupo "opõem-se" as folhosas, quase todas de folha caduca (no Outono e de que as magnoleáceas serão excepção porque são sempre-verdes), altamente ricas nos seus componentes minero-orgânicos e cuja folhada ou manta morta constitui um denso e macio tapete que o tempo biodegrada e dá origem ao húmus doce ou alcalino (mull).





Das formas das árvores aos jardins

As copas têm as mais variadas formas bem como as folhas sempre macias e mesmo frágeis, simples ou compostas e mesmo re-compostas, de muito pequena dimensão como as dos belos jacarandás de flor lilás em junho, ou as das magníficas e gigantescas faias de folha verde ou rubra, os plátanos tão acusados de provocar alergias com os seus frutos múltiplos de aquénios, ou as enormes folhas das pequenas Catalpa bignonioides ou, ainda, as esplendorosas tílias de cujas flores nos habituámos a beber chá e a usufruir a sombra à porta de casa ou beneficiar da luz coada como que por abat-jour, e que têm, algumas, folhas em forma de coração (Tília cordata), ou a levar para casa aqueles molhos de frutos com forma estranha de di-sâmaras, que escondem e protegem as suas sementes, muito pequeninas, que precisam daquelas grandes "asas" para que o vento as leve muito longe, para povoar os territórios e a vida se desmultiplique em segurança.

E se por acaso se gostar de ouvir o vento, que melhor ocasião e lugar do que entrar numa floresta (ou mesmo mata ou parque e jardim) e ouvir a música das folhas e ramos que se entrelaçam e quase agridem, bem como não haverá melhor lugar para ouvir a música do total silêncio e ficarmos ali, parados, como que integrados naquele lugar e de alma consolada na companhia daquelas irmãs-de-vida.






Está hoje um dia de vento e eu gosto do vento
O vento tem entrada nos meus versos de todas as maneiras e
só entram nos meus versos as coisas de que gosto
O vento das árvores o vento dos cabelos
o vento do Inverno o vento do verão
o vento é o maior veículo que conheço
Só ele traz o perfume das flores só ele traz
a música que jaz à beira-mar em Agosto
Mas só hoje soube o verdadeiro valor do vento
O vento actualmente vale oitenta escudos
Partiu-se o vidro grande da janela do meu quarto

O valor do vento
Ruy Belo - Homem de palavra, 1978


PLANTAI ÁRVORES


PLANTAI VIDA







Lisboa 28 de Outubro a 8 de Novembro - Bairro de Santo Amaro

Maria celeste d'Oliveira Ramos
Engª. silvicultora e arquitecta-paisagista

Revisto para publicação no Infohabitar e re-ilustrado por António Baptista Coelho (figuras), em 11 de Fevereiro de 2007. Editado por José Baptista Coelho em 15 de Fevereiro de 2007

Nota de editor:
Acaba aqui a primeira parte deste novo excelente e grande artigo de Celeste Ramos que, na próxima semana terá conclusão, também aqui no Infohabitar com a “A árvore suporte do mundo no espaço urbano (II) – das árvores/jardins”.
Este artigo corresponde ao texto-base de uma conferência que foi proferida pela Arq.ª Maria Celeste Ramos em Novembro de 2006 em Lisboa, na Universidade Nova, FCSH.


Alguns sites que “falam” de árvores:

http://www.dias-com-arvores.blogsopt.com/

http://arborday.org/trees/majTreesMain.cfm

http://asiatours.net/press/en/images-laos.html

http://www.europanostra.org/images/awards_2004_winners/buckelwiesen2.jpg

http://fount-k.com/~tomo/sumb/yun_2654.jpg

http://www.owlfish.com/weblog/2004/10/toronto-autumn.jpg

http://www.britishacorn.com/tourism/sandalwood/index.html

http://www.fireflybooks.com/travel/new.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/Imagem:Jakarta_silhouetto.jpg

1 comentário :

Anónimo disse...

«E se por acaso se gostar de ouvir o vento, que melhor ocasião e lugar do que entrar numa floresta (ou mesmo mata ou parque e jardim) e ouvir a música das folhas e ramos [...]». [Celeste Ramos].

E dizia o poeta, Alberto Caeiro, que «Só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido».

Mas... (há sempre um «mas» ou como dizia outro poeta «o mal de perguntar não tem resposta»)... em que medida insistimos na absoluta oposição entre a natureza e a sociedade humana, ou na ideia de que o «progresso» se traduz invariavelmente na emergência de uma sociedade destradicionalizada (e, logo, socialmente alienada?), e de uma natureza desnaturada (impactada pela expansão da ocupação urbana)?

À partida, a (nova) ideia de «desenvolvimento sustentável» deveria dirimir estas dicotomias (social/natural, modernidade/tradição)...

Mas (outro «mas»... e pelos exemplos dados de desrespeito pelo «desenvolvimento sustentável»», em que este se transformou numa referência jurídica - e até constitucional -sem consequências ao nível do ordenamento do território) talvez a (nova) ideia da «desenvolvimento sustentável» não seja mais que um eufemismo ou, na boca dos políticos, uma «maneira de bem dizer». [João Lutas Craveiro]