domingo, junho 19, 2011

351 - Por uma nova política de habitação de interesse social em Portugal - Infohabitar 351

Infohabitar, Ano VII, n.º 351


Do passado ao futuro da Habitação de Interesse Social II: algumas linhas temáticas de reflexão prática sobre uma urgente nova política de habitação de interesse social em Portugal

António Baptista Coelho

(nota prévia: ao contrário do que é quase regra no Infohabitar este artigo não é ilustrado)

1. Introdução e enquadramento

No primeiro artigo intitulado "Do passado ao futuro da Habitação de Interesse Social (I)", que integrou a 347.ª edição do Infohabitar, foi abordada "a situação em Portugal, considerando-se o enquadramento qualitativo e o perfil das Recomendações Técnicas para Habitação Social (RTHS) - o documento recomendativo/legal que enquadra a nossa Habitação de Interesse Social (HIS) desde cerca de 1984.

Esse primeiro artigo aproveitou a oportunidade de estar então a acontecer o aniversário da criação do Instituto Nacional de Habitação (INH), uma instituição que foi, em muitos casos, uma verdadeira escola de boas práticas e que esteve assim ligada a muitos casos exemplares da HIS portuguesa - actualmente Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU).

Lembra-se que o INH surgiu por altura de uma anterior intervenção do FMI em Portugal (intervenções do FMI em 1977 e em 1983, sendo o INH criado em 25 de Maio de 1984), e a sua actividade, que foi, logo desde início, bem apoiada pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e designadamente pelos seus Departamento de Edifícios (DED) e Núcleo de Arquitectura e Urbanismo (NAU), teve, então, reflexos positivos e razoavelmente rápidos num adequado enquadramento e numa estratégica uniformização e melhoria qualitativa da HIS que se fez em Portugal antes do INH, no primeiro decénio após o 25 de Abril de 74 e mesmo anteriormente a esta data - período pontuado por alguns excelentes exemplos de habitar participado e à escala humana (ex., alguns conjuntos do SAAL), mas um período muito marcado por numerosos maus exemplos de HIS caracterizados pela concentração e segregação social, pela uniformização e inadequação social/funcional de projectos e pela monotonia/tristeza das respectivas imagens urbanas.

Salienta-se ainda que dão que pensar as referências que o actual acordo com o FMI e a UE também fazem a uma urgente mudança na nossa política habitacional: se houve política habitacional nos últimos anos, quando nem uma Secretaria de Estado esteve associada à designação de "habitação" e quando talvez "à conta" de um desejado priviligear de uma reabilitação urbana que afinal nunca arrancou, se optou por dar a entender ser pouco necessária mais construção nova de HIS, numa situação que hoje em dia fica ainda mais posta em causa com o avolumar das actuais novas situações de grave carência habitacional por parte de pessoas com muito poucos recursos (e quem está alerta para estas matérias não precisou das últimas notícias saídas na comunicação social sobre este facto, para dar conta do renascimento de tantos pequenos e escondidos núcleos de barracas, bem como da miséria escondida na sobreocupação e nos quartos alugados).

E citam-se os objectivos do "Memorando de Entendimento sobre as Condicionantes de Política Económica" (acordado entre o Governo e o FMI/UE), relativos ao "mercado da habitação": Melhorar o acesso das famílias à habitação; promover a mobilidade laboral; melhorar a qualidade das habitações e aproveitar melhor as casas de habitação já existentes; e reduzir os incentivos ao endividamento das famílias.

Por estas e outras razões, às quais voltaremos em outros artigos desta série, se apontam, em seguida, de uma forma apenas minimamente estruturada, algumas reflexões sobre o que poderão ser "algumas linhas temáticas de reflexão prática sobre uma urgente nova política de habitação de interesse social em Portugal", ou talvez se devesse dizer da recuperação de "uma verdadeira política de habitação de interesse social", que tem estado muito ausente nos últimos anos, com naturais excepções e designadamente aquelas que foram assinaladas no primeiro artigo desta série.

Faz-se notar que a referência, que se faz em seguida, a novas intervenções de HIS engloba seja construção nova em contextos urbanos preexistentes, seja acções de reabilitação e revitalização de conjuntos de HIS preexistentes e, sempre que aplicável, as acções de reabilitação correntes, que visem a melhoria de habitações com interesse social e mesmo as melhorias de habitabilidade e urbanidade em muitas periferias urbanas desvitalizadas.

Faz-se ainda notar que a referência à disponibilização de HIS deve ser sempre entendida num quadro de disponibilização de "Habitação e Cidade/Vizinhanças de Interesse Social", de outra forma continuaríamos no velho caminho da criação de "guetos", ainda que pequenos e bem disseminados.

2. Síntese de 20 linhas temáticas de reflexão prática sobre uma urgente nova política de habitação de interesse social em Portugal

São as seguintes as 20 "linhas temáticas de reflexão prática sobre uma urgente nova política de habitação de interesse social em Portugal", consideradas neste artigo e que são, depois, muito sumariamente comentadas:

• Procura sistemática de uma adequação social efectiva das novas intervenções de HIS.

• Exigir uma arquitectura urbana qualificada nas novas intervenções de HIS.

• Papel urbano dinamizador das novas intervenções de HIS.

• Exigir intervenções de HIS caracterizadas por pequena escala urbana e cuidados específicos de integração errandicando-se todas as intervenções com escala física e social excessivas.

• As novas intervenções de HIS devem ser constituídas por edifícios cuidadosamente caracterizados e concebidos.

• As novas intervenções de HIS devem servir os velhos e os novos modos de vida doméstica, vicinal, urbana e peri-urbana.

• As novas intervenções de HIS devem ser tipologicamente adequadas em termos de soluções arquitectónicas e urbanas.

• As novas intervenções de HIS devem ter valia cultural/urbana específica.

• As novas intervenções de HIS devem traduzir-se na integração de equipamentos colectivos com carácter convivial e que sirvam os habitantes próprios e da zona envolvente.

• Desenvolvimento de um equilíbrio financeiro maximizado e de uma adequada gestão local das novas intervenções de HIS.

• Nas novas intervenções de HIS deve privilegiar-se o arrendamento, procurando-se que este seja o mais possível equilibrado em termos financeiros e de amortização dos investimentos iniciais e dos ligados à manutenção e gestão.

• Preocupações e exigências de construção adequada às novas intervenções de HIS, e aplicando a experiência acumulada.

• Estudar e sintetizar uma gradação de exigências e soluções associadas à sustentabilidade ambiental a aplicar na promoção de HIS.

• As novas intervenções de HIS devem associar a intervenção física à intervenção social, ainda que as duas possam ser estrategicamente autonomizadas.

• Nas novas intervenções de HIS deve privilegiar-se uma cuidadosa, mas sistemática, miscigenação sociocultural e etária.

• As novas intervenções de HIS devem poder cumprir, sequencialmente, um papel de volante ou "elevador" social para muitas pessoas e famílias.

• A caracterização arquitectónica e urbanística das novas intervenções de HIS deve participar na resolução dos problemas de integração das minorias étnicas.

• As novas intervenções de HIS podem (ou devem) ser estruturadas em diferentes níveis associados, designadamente, a um leque de condições de espaciosidade doméstica e de caracterização dos acabamentos.

• As novas intervenções de HIS devem ser sujeitas a um processo sistemático e programado de avaliação retrospectiva, que considere tanto as análises técnicas específicas como a satisfação dos moradores.

• Uma nova política de HIS tem de ser intimamente integrada com as medidas de dinamização da urgente reabilitação urbana.

3. Comentários sobre 20 linhas temáticas de reflexão prática sobre uma urgente nova política de habitação de interesse social em Portugal


Tal como se referiu, as vinte linhas temáticas de apoio ao desenvolvimento de uma nova política de habitação de interesse social são, em seguida, minimamente comentadas.

1. Procura sistemática de uma adequação social efectiva das novas intervenções de HIS:

Adequação global – arquitectónica e urbanística – das soluções de habitação de interesse social, que devem ser socioculturalmente adequadas e capazes de participar como elemento com sinal positivo na melhoria dos percursos de vida dos respectivos habitantes, matérias que têm relações directas com as soluções escolhidas em termos de tipos de edifícios, seus espaços e equipamentos comuns, existência de espaços privados exteriores, configuração de vizinhanças, relacionamento e vitalização citadina, etc. Este objectivo prático não se resume, naturalmente, em "fórmulas infalíveis", mas tem de ser continuamente procurado e aproximado, através da sensibilidade dos respectivos projectos, da relação com casos de referência devidamente provados na sua valia técnica e social e de uma conínua retroacção e retrospectiva relativamente aos ensinamentos que decorrem da melhor obra feita.

2. Exigir uma arquitectura urbana qualificada nas novas intervenções de HIS:

caracterizar-se por uma concepção arquitectónica marcada pela dignidade e sobriedade sem quaisquer conotações de imagens associáveis a habitação com carácter "assistencial", paisagisticamente bem integrada e valorizadora do sítio de implantação, sempre que possível associada ao desenvolvimento de espaços públicos estimulantes, bem acabados e duráveis/fáceis de manter, positivamente apropriável pelos respectivos habitantes e adaptável a diversas formas de habitar, caracterizada pelo adequado controlo dimensional e de acabamento dos espaços habitacionais.

3. Papel urbano dinamizador das novas intervenções de HIS:


As novas intervenções de habitação de interesse social devem participar, passiva e activamente, na dinamização sociourbana dos respectivos locais de implantação, havendo equilíbrio por introdução de números reduzidos de habitações em cada sítio, parceria activa em termos de introdução de equipamentos locais ou urbanos em falta, designadamente, associados à dinamização do tecido económico local e sua influência na respectiva envolvente urbana

4. Exigir intervenções de HIS caracterizadas por pequena escala urbana e cuidados específicos de integração errandicando-se todas as intervenções com escala física e social excessivas:

Nas novas intervenções de HIS há que privilegiar a pequena escala urbana e uma aprofundada e sensível capacidade de integração paisagística e ambiental, sendo de não se aceitarem situações opostas de grande escala física e /ou social e de ausência de harmonização paisagística, uma situação que se considera ser tanto mais crítica quanto mais sensíveis forem os grupos socioculturais em presença.

5. As novas intervenções de HIS devem ser constituídas por edifícios cuidadosamente caracterizados e concebidos:

Nas novas intervenções de HIS há que privilegiar a aplicação de edifícios com escala humana, simples de gerir e de manter, e usáveis sem recurso a elementos mecânicos e dispositivos complexos de gerir/manter em boas condições funcionais. Nesta matéria importa ter bem presente que a boa adequação do edificado não determina a boa integração social mas, sem dúvida, pode facilitá-la ou, pelo contrário, prejudicá-la e dificultá-la e não podemos arriscar fazer novos conjuntos que não sejam elementos basicamente facilitadores dessa integração, havendo em Portugal muitos casos de referência positivos que nos podem e devem orientar.

6. As novas intervenções de HIS devem servir os velhos e os novos modos de vida doméstica, vicinal, urbana e peri-urbana:

Não mais soluções únicas ou quase-únicas para uma actualidade de tantos velhos e novos modos de vida doméstica, vicinal, urbana e peri-urbana; e aqui se volta ao "reino" da tipologia num processo conceptual tão exigente como potencialmente muito rico.

7. As novas intervenções de HIS devem ser tipologicamente adequadas em termos de soluções arquitectónicas e urbanas:

Esta é uma matéria profundamente arquitectónica que decorre de uma urgente necessidade de se aprofundarem estudos tipológicos associados à caracterização de viznhanças, edifícios e habitações; estudos estes com forte carácter prático e que não estejam limitados por estranhos "tabus" que parecem querer fazer esquecer a longa e rica história tipológica do habitar em geral e da HIS portuguesa em particular.

8. As novas intervenções de HIS devem ter valia cultural/urbana específica:

Esta é uma matéria essencial, que decorre de se tratar de investimentos públicos, de ser necessário marcar os novos conjuntos de HIS com uma caracterização claramente positiva (bem ao contrário do que era infelizmente corrente há algumas dezenas de anos e ainda hoje em alguns casos), e afinal, de assim se poder proporcionar uma verdadeira mais-valia sociocultural aos investimentos públicos aplicados nesses novos conjuntos; e lembremo-nos de alguns casos recentes de promoções de HIS realizadas por arquitectos de renome para termos a noção da viabilidade real desta perspectiva.

9. As novas intervenções de HIS devem traduzir-se na integração de equipamentos colectivos com carácter convivial e que sirvam os habitantes próprios, mas também da respectiva zona envolvente:

De certa forma mais do que fazer apenas nova habitação de interesse social (HIS), há que ir fazendo e refazendo pequenos troços de Cidade de Interesse Social, num processo muito marcado pela integração de equipamentos colectivos com carácter convivial e que sirvam os habitantes de cada vizinhança e das respectivas zonas envolventes, numa perspectiva que pouco tem a ver com a simples previsão dos equipamentos indicados nos PDM - por vezes esta indicação é até despropositada e perigosa em termos de desvitalização urbana (muitos equipamentos térreos vagos e grandes garagens colecivas vazias e emparedadas) - e que nada tem a ver com a introdução de equipamentos que sejam verdadeiros "bloqueios" à continuidade urbana; tem de haver assim uma fortíssima integração do habitar a habitação com o habitar dos equipamentos e uma extrema sensibilidade relativa a cada situação específica.

10. Desenvolvimento de um equilíbrio financeiro maximizado e de uma adequada gestão local das novas intervenções de HIS:

Importa assegurar e maximizar a sustentabilidade financeira de cada nova operação de introdução de habitação de interesse social – em termos de controlo do investimento (controlo com múltiplos factores entre os quais os dimensionais) e respectiva amortização, equilíbrio de exploração e ganhos de valorização do respectivo património, papel da operação como intervenção económica e social localmente dinamizadora e garantia de um acompanhamento social e em termos de gestão local com continuidade e eficácia e devidamente sustentado em termos económicos. Uma matéria que é tão sensível, como complexa, como vital para o êxito das operações; e que muito tem a ganhar com um urgente levantamento das excelentes boas práticas existentes, entre as quais há que salientar muitos casos de iniciativa cooperativa ligados à Feferação Nacional de Cooperativas de Habitação Económica (FENACHE).

11. Nas novas intervenções de HIS deve privilegiar-se o arrendamento, procurando-se que este seja o mais possível equilibrado em termos financeiros e de amortização dos investimentos iniciais e dos ligados à manutenção e gestão:

Esta matéria é tão importante como específica, devendo ser tratada por especialistas. No entanto há aspectos que devem ser bem tomados em conta na respectiva "equação", designadamente, aqueles associados aos processos apurados para se responsabilizarem os ocupantes pela manutenção corrente e pelo eventual mau uso dos seus espaços de habitar - desde a vizinhança, ao edifício e à habitação; não basta solucionar a difícil questão das rendas há que assegirar a sua articulação com o respeito pelo património habitacional, caso contrário geram-se círculos viciosos de mau uso e de más condições de habitabilidade e de vida social.

12. Preocupações e exigências de construção adequada às novas intervenções de HIS, e aplicando a experiência acumulada:

As novas intervenções no âmbito da habitação de interesse social devem caracterizar-se por economia e racionalidade na construção, pela aplicação de soluções simples e materiais duráveis e fáceis de manter, pela escolha de soluções tecnologicamente adequadas, em termos de: garantia de uma excelente realização da obra; adequada resistência ao uso normal e a eventuais acções de vandalismo; sustentatibilidade económica global e local/regional, sendo positivas para o tecido económico local; e de sustentabilidade ambiental (devidamente ponderada). Assim se contribui para a dignificação pessoal dos utentes e para o papel social da própria intervenção de HS, e netas matérias e noutras a experiência do LNEC será de grande utilidade.

13. Estudar e sintetizar uma gradação de exigências e soluções associadas à sustentabilidade ambiental a aplicar na promoção de HIS:

Considerando-se os habituais custos suplementares das matérias associadas à sustentabilidade ambiental e a urgência da sua aplicação, desenvolver um "menu" de soluções recomendáveis e/ou obrigatórias numa perspectiva de graduação estratégica da sua aplicação ao longo do tempo e consoante o tipo de promoção (mais ou menos apoiada pelo Estado); uma das ideias aqui presente é que sejam rapidamente tornados obrigatórios os aspectos associados à aplicação de estratégias de aproveitamento de energia solar passiva, dinamização do aproveitamento da iluminação natural, aplicação de uma verdadeira estratégia de ventilação natural cruzada e melhoria das condições de conforto acústico por adequados posicionamentos funcionais - portanto aspectos que não implicam gastos suplementares e que têm variados, diversos e imediatos benefícios para o bem-estar e para as finanças dos habitantes; e há que referir quen esta perspectiva, julgada de bom senso, é exactamente oposta a soluções mal arquitectadas em todas estas matérias e, depois, carregadas com "inovações" tecnológicas associáveis a aspectos ambientais.

14. As novas intervenções de HIS devem associar a intervenção física à intervenção social, ainda que as duas possam ser estrategicamente autonomizadas:

As novas intervenções de HIS devem associar a intervenção física à intervenção social, ainda que as duas possam ser estrategicamente autonomizadas. E também nestas matérias e considerando a desejável autonomização e melhoria da eficácia da intervenção social é muito importante tentar replicar e multiplicar as melhores práticas associadas a intervenções municipais e de cooperativas de habitação integradas na FENACHE, numa perspectiva em que se pretende ligar as diversas actividades aos agentes para elas mais vocacionados, reduzindo-se significativamente o peso do Estado em todos este processo e melhorando-se, tendencialmente, a sua eficácia.

15. Nas novas intervenções de HIS deve privilegiar-se uma cuidadosa, mas sistemática, miscigenação sociocultural e etária:

O privilegiar de uma cuidadosa, mas sistemática, miscigenação sociocultural e etária nas novas intevenções de HIS deve ser regra geral, a especificar consoante as especificidades dos sítios, dos conjuntos de grupos socioculturais e das próprias soluções arquitectónicas, havendo que considerar também a população envolvente/de acolhimento nesse desejável equilíbrio, que deve contribuir para melhores condições urbanas locais e que tem de ser adequadamente dialogado e bem acompanhado.

16. As novas intervenções de HIS devem poder cumprir, sequencialmente, um papel de volante ou "elevador" social para muitas pessoas e famílias:

Tal como já se refere noutro ponto deste texto, o quadro físico - arquitectónico e urbano - não determina, mas facilita ou dificulta, um sentido de integração/ascensão social de pessoas e famílias sociocultural e finaceiramente sensíveis, e, sendo assim, há que prover a que o investimento público, feito nesse sentido, possa influenciar um máximo de pessoas, pelo que importa regulamentar o acesso/manutenção do apoio do Estado à habitação e à cidade, designadamente, em condições de carência e sensibilidade social críticas, provavelmente associadas a uma disponibilização de habitação em troca de uma contribuição pessoal e familiar pouco mais do que simbólica; mas mesmo esta é uma matéria que tem de ser devidamente desenvolvida nos seus aspectos processuais de modo a que este serviço habitacional "especial" possa ter o máximo de eficácia com um mínimo de investimento público.

17. A caracterização arquitectónica e urbanística das novas intervenções de HIS deve participar na resolução dos problemas de integração das minorias étnicas:

Esta é uma já velha questão que é sempre recorrente, continuando-se muitas vezes "em frente", sem se aprender com êxitos e fracassos passados e ressuscitando-se, sempre, o formato de estudos tão teóricos que, por vezes, é impossível deles retirar uma única pista prática de apoio ao projecto, como se houvesse receio em colocar "preto no branco" algumas ideias; e atente-se ao sentido muito crítico que tem este problema nos nossos principais parques de HIS, onde contribui para uma grande parte dos respectivos problemas sociais e de gestão. É, portanto, essencial cortar, de vez, com mais reflexões sem sentido prático, aprender com as melhores práticas nacionais e estrangeiras e acompanhar as operações de uma forma eficaz e marcada pela clara responsabilização de quem habita relativamente à forma como são tratados espaços públicos, edifícios e habitações, assim como pela ideia clara de que o estauto de minoria não confere qualquer isenção dessas responsabilidades e de uma adequada socialização relativamente aos outros grupos socioculturais em presença.

18. As novas intervenções de HIS podem, ou devem, ser estruturadas em diferentes níveis associados, designadamente, a um leque de condições de espaciosidade e de acabamentos domésticos:

A questão de se poder diferenciar, um pouco e de forma devidamente controlada, as novas intervenções de HIS em termos de alguma diversidade de condições domésticas, de espaciosidade e de acabamento, é uma matéria desde há muito discutida e que actualmente se refere a uma oferta "complexa" ou relativamente pouco clarificada dessa possibilidade, sendo desejável a racionalização e simplificação desta situação, aceitando-se talvez condições razoável mas expressivamente mínimas, embora obrigatoriamente muito bem concebidas em termos arquitectónicos, quando a intervenção de HIS é em grande parte apoiada pelo Estado e não tem assim um equilíbrio financeiro garantido; e sendo que poderá haver um pequeno leque de oferta de HIS (afinal tal como já hoje acontece), no qual o apoio do Estado é estrategicamente reduzido em determinadas promoções, por exemplo, podendo em alguns casos limitar-se a uma facilitação no acesso aos terrenos, à dinamização do processo de licenciamento e a uma redução de encargos admistrativos. Finalmente, propõe-se esta temática para desenvolvimento posterior e urgente. E nestas matérias a existência de dois níveis de espaciosidade/acabamentos na promoção de HIS cooperativa pode oferecer um dos caminhos de referência, assim como é muito recomendável o revisitar de experiências e práticas europeias e recentes nestas matérias.

19. As novas intervenções de HIS devem ser sujeitas a um processo sistemático e programado de avaliação retrospectiva, que considere análises técnicas e satisfação dos moradores:

Uma nova política de HIS tem de se caracterizar pelo fim da "tábua rasa" sobre como fazer HIS, uma "tábua-rasa" que sistematicamente desprezou a experiência adquirida ou registada, e tem de ser marcada pelo aproveitamento dos exemplos de referência, pela procura das melhores soluções e pela sua discussão teórico-prática e sistemática, num periódico processo de retroacção e de melhoria das soluções e da rendibilização dos respectivos investimentos; e nestas matérias o amplo conhecimento que se tem da história recente da HIS e a existência de ferramentas práticas de avaliação retrospectiva, que integram análises técnicas e da satisfação dos moradores, proporcionam que se desenvolva esta medida - e o LNEC possui uma ferramenta experimentada na área das análises retrospectivas.

20. Uma nova política de HIS tem de ser intimamente integrada com as medidas de dinamização da urgente reabilitação urbana:

E termina-se, com a "linha temática" n.º "20", um número sempre mítico, e com a exigência de que os novos (e sistematicamente pequenos) conjuntos de HIS deverem ser privilegiadamente desenvolvidos (i) em espaços de preenchimento e revitalização urbanística, (ii) numa íntima aliança com operações de reabilitação urbana, (iii) e mesmo assumindo-se, frequentemente, como operações de reabilitação e reconversão simples/correntes de velhos edifícios.

E lança-se aqui a ideia de uma linha de desenvolvimento da reflexão sobre uma nova política de HIS bem ligada a uma nova política de reabilitação urbana, que procuraremos realizar em futuros artigos desta série.

Breve nota final:
Uma reflexão de síntese sobre estes 20 aspectos, que poderão ser ainda mais alguns ou que poderão ser em menor número, através de uma sua estratégica e mútua associação, terá de ficar para outros artigos desta série.

Notas editoriais:


(i) A edição dos artigos no âmbito do blogger exige um conjunto de procedimentos que tornam difícil a revisão final editorial designadamente em termos de marcações a bold/negrito e em itálico; pelo que eventuais imperfeições editoriais deste tipo são, por regra, da responsabilidade da edição do Infohabitar, pois, designadamente, no caso de artigos longos uma edição mais perfeita exigiria um esforço editorial difícil de garantir considerando o ritmo semanal de edição do Infohabitar.


(ii) Por razões idênticas às que acabaram de ser referidas certas simbologias e certos pormenores editoriais têm de ser simplificados e/ou passados a texto corrido para edição no blogger.


(iii) Embora a edição dos artigos editados no Infohabitar seja ponderada, caso a caso, pelo corpo editorial, no sentido de se tentar assegurar uma linha de edição marcada por um significativo nível técnico, as opiniões expressas nos artigos apenas traduzem o pensamento e as posições individuais dos respectivos autores.






Infohabitar a Revista do Grupo Habitar


Editor: António Baptista Coelho


Edição de José Baptista Coelho


Lisboa, Encarnação - Olivais Norte


Infohabitar, Ano VII, n.º 351, 19 de Junho de 2011

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